domingo, 21 de janeiro de 2007

Os Jovens Turcos

Os políticos tendem a ser crípticos nos seus discursos. É vulgar assistirmos a elucubrações aparentemente incompreensíveis ou a frases desgarradas e desprovidas de qualquer sentido que despertam em nós o profundo desconsolo de percebermos que o emissor está a dizer algo de realmente importante, mas que o receptor (nós), não entende por lhe faltarem os dados culturais ou situacionais que lhe permitam descodificar a mensagem oculta nas entrelinhas.Quantas e quantas vezes são passados recados que apenas alguns "inteligentes" compreendem? Quantas mensagens encriptadas caem no ridículo por parecerem desprovidas de qualquer sentido? (Quem não se lembra do famoso: Eu sei que você sabe que eu sei que você sabe que eu sei.?)

O Barreiro também tem os seus políticos e a política Barreirense também tem as suas entrelinhas, e não tem poucas, tem as bastantes para que nos dediquemos a uma exploração mais ou menos regular dos termos e expressões utilizados nos discursos dos nossos concidadãos mais loquazes e, com isso, fazermos uma modesta contribuição para a cultura política de quem tenha algum interesse nestes temas.Não entraremos aqui em considerações sobre nenhum discurso em particular nem nos dedicaremos a destrinçar e a descodificar esta ou aquela afirmação de alguém em particular. Por ora, seremos felizes por colocar à disposição dos nossos leitores algumas ferramentas, na forma de definições, que permitam que, cada um por si, faça a sua leitura das entrelinhas e enriqueça o seu vocabulário político.

Comecemos então com a expressão da semana.

1- Os Jovens Turcos

Cerca de 1889 formaram-se na Turquia organizações constituídas essencialmente por jovens estudantes e cadetes das Academias Militares. Com a abolição da Constituição pelo Sultão Abdul Ahmid II, estas organizações tornaram-se clandestinas e organizaram-se como sociedades secretas à imagem da Carbonária, formando células em que apenas um elemento estaria ligado a outra célula. Chamou-se a esta organização Jovens Turcos, ou Jöntürkler na língua original.

Os princípios que guiavam este movimento eram, no essencial, o Liberalismo, o Materialismo, o Positivismo, o Constitucionalismo e a Centralização do Governo. O Nacionalismo que os caracterizou a partir de 1904 não foi uma constante ao longo da história desta organização que deixou raízes que ainda se sentem na política Turca de hoje.

Defendiam então, em linhas gerais, que era necessário fazer uma revolução que permitisse transformar a sociedade numa em que a religião não fizesse parte da política do estado. Para eles, o governo devia ser a emanação de uma elite intelectual que faria parte dos corpos governativos e que não levaria em linha de conta a opinião das massas, por não acreditarem na igualdade entre os cidadãos, estabeleciam assim, o elitismo intelectual como forma de organização do estado.

Depois de viverem na clandestinidade até 1906, os Jovens Turcos tornaram-se um verdadeiro movimento revolucionário ao infiltrarem o Comité de União e Progresso (CUP - um dos partidos políticos da oposição na Turquia daquela época) e ao recrutarem os líderes militares da Terceira Base do Exército Turco. No Segundo Congresso da Oposição Turca, em Paris, em 1907, tentaram unir toda a oposição numa única organização, por forma a provocar a revolução, no entanto, divergências políticas entre as facções tornaram a união impossível.

No início do Século XX, o Império Otomano deparava-se com a Questão da Macedónia. Desde 1897, a Rússia e o Império Austro-Húngaro mostraram-se interessados em dominar os Balcãs e desenvolveram políticas que levaram ao último estágio do processo de Balcanização daquela àrea geográfica e, a partir de 1903 iniciaram conversasões no sentido de estabelecer administrações Austríacas e Russas nas províncias da Macedónia. O Sultão foi forçado a aceitar esta ideia, apesar de, durante algum tempo ter conseguido atrasar a sua implementação. Nesta altura, a influência e a dimensão do CUP já tinha crescido tanto que puderam dizer ao Sultão que "a Dinastia estaria em perigo se ele não voltasse a implementar a Constituição". O Terceiro Exército na Macedónia marchou sobre o palácio Imperial e, a 24 de Julho de 1908, a Constituição foi restaurada na Turquia.O poder dos Jovens Turcos foi consolidado no golpe militar de 1913 que acabou com a Monarquia da casa de Osman e iniciou o período ditatorial do Triunvirato dos Três Paxás, que apenas terminaria com o fim da I Grande Guerra, em 1918.

Os Jovens Turcos deixaram uma tradição de dissidência que moldou a vida intelectual e política do final do período Otomano e lançou as fundações para a revolução de Atatürk. A ideologia do estado Turco moderno foi criada lançada durante este período e os Jovens Turcos que sobreviveram até à criação da República da Turquia puderam ver a maior parte das suas ideias concretizadas.

Hoje em dia, chamam-se Jovens Turcos a grupos ou facções que reivindicam agressiva ou impacientemente reformas no interior de uma organização, lutando contra o conservadorismo instalado da velha guarda para impor uma nova visão, mais moderna e renovadora.

Pedro Estadão

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