segunda-feira, 5 de fevereiro de 2007

As Trinta e Seis Estratégias

“As Trinta e Seis Estratégias” são uma colecção de provérbios chineses usados para ilustrar tácticas e estratégias militares. O nome vem do sétimo volume biográfico do “Livro de Qi”, que contém a biografia de Wang Jingzé. Wang foi um general que serviu o Qi do Sul, (China do Sul), desde o primeiro Imperador da Dinastia Gao. Quando o Imperador Ming subiu ao poder e mandou executar uma série de membros da corte e da família real por recear que fossem uma ameaça ao seu reinado, Wang pensou que iria a seguir e revoltou-se. Quando Wang ouviu dizer que o Marquês de Donghun, filho do Imperador Ming, havia fugido ao saber da rebelião, comentou que “das trinta e seis estratégias do Senhor Tan, a retirada era a sua melhor, e o melhor que pai e filho têm a fazer é fugir”. O Senhor Tan aqui referido é o General Tan Daoji da Dinastia Liu Song, que foi forçado a retirar após um ataque falhado ao Wei do Norte, e Wang menciona o seu nome com desprezo por ser um exemplo de covardia.

Deve-se notar que o número trinta e seis foi usado por Wang como uma figura de expressão, com o objectivo de referenciar “numerosas estratégias”em lugar de um qualquer número específico. A escolha deste termo é uma referência ao I Ching, onde seis é o numero do Yin, que possui muitas das características comummente associadas aos esquemas perversos utilizados em estratégia militar. Como trinta e seis é o quadrado de seis, funciona como metáfora para “numerosas estratégias”. Apesar de Wang não se referir a nenhum número específico de estratégias, depois desta sua afirmação foi criado um conjunto de trinta e seis provérbios com ligação a tácticas militares que dele levou emprestado o nome.

As “Trinta e Seis Estratégias” têm sido atribuídas alternadamente quer a Sun Tzu, quer a Zhuge Liang, mas nenhum deles foi considerado o seu verdadeiro autor pelos historiadores. A versão prevalecente é de que os provérbios tiveram a sua origem tanto na tradição oral como na escrita com inúmeras versões compiladas por diferentes autores ao longo da história da China. “As Trinta e Seis Estratégias” aparecem muitas vezes ligadas aos escritos de Sun Tzu, mas diferem da “Arte da Guerra” por serem um livro de tácticas em lugar de um texto sobre grande estratégia.

O manuscrito original que a seguir se apresenta traduzido por nós, a partir do inglês, foi descoberto na província de Saanxi, na China, e foi impresso por um editor local em 1941. O seu autor ou data de elaboração permanecem desconhecidos até hoje. Parecendo-nos de suprema importância a divulgação desta pérola do pensamento estratégico junto do público, aventurámo-nos a esta tarefa, que não pretende ser senão uma aproximação ao que seria um bom trabalho editorial, aconselhando os interessados a procurar numa livraria alguma publicação sobre este tema que contenha uma análise mais detalhada e avisada do seu conteúdo.

Um ditado popular chinês diz que “Só existem trinta e seis estratégias debaixo do céu”, significando que todas as tácticas usadas em batalhas históricas ou modernas são variações das trinta e seis originais. Pode não ser assim tão simples, no entanto, vale a pena pensar sobre isso…

11 – As Trinta e Seis Estratégias

“As Trinta e Seis Estratégias” estão divididas num Prefácio, seis capítulos contendo seis estratégias cada e um Posfácio de que se perdeu o texto. Os primeiros três capítulos decrevem em traços gerais estratégias para uso em situações de vantagem, enquanto os últimos três capítulos contêm estratégias mais apropriadas para condições desvantajosas. O texto original de “As Trinta e Seis Estratégias” também é bastante breve, com cada provérbio a ser acompanhado por um curto comentário de não mais que uma frase ou duas que explicam como cada provérbio se aplica às tácticas militares. Estes trinta e seis provérbios referem-se a trinta e seis batalhas históricas, retiradas principalmente das fábulas históricas do Período dos Estados Guerreiros e do Período dos Três Reinos. Por razões de simplicidade, não colocaremos aqui o prefácio nem o pouco que existe do posfácio.

Capítulo 1 – Estratégias vencedoras

1- Enganar o céu para atravessar o oceano

Movimentar-se na escuridão e nas sombras, ocupar lugares isolados ou esconder-se só vai atrair a atenção e a suspeita. Para baixar a guarda de um inimigo deve-se agir em campo aberto e disfarçar as verdadeiras intenções atrás das actividades comuns do dia-a-dia.

2- Assediar Wei para salvar Zhao

Quando o inimigo é demasiado forte para se atacar frontalmente, então deve-se atacar algo que é precioso para ele. Fica a saber que ele não pode ser superior em todas as coisas, algures, há uma falha na armadura, uma fraqueza que pode ser atacada em alternativa.

3- Matar com uma faca emprestada

Ataca usando a força de outro (numa situação em que usar a própria força não é favorável). Convence um aliado a atacar o teu inimigo, suborna um deles para se tornar traidor ou usa a força do inimigo contra ele próprio.

4- Trocar o trabalho pelo lazer

É uma vantagem escolher o tempo e o lugar da batalha. Desta maneira saberás quando e onde a batalha vai decorrer, enquanto o teu inimigo não. Encoraja o teu inimigo a gastar a sua força em actividades fúteis enquanto conservas a tua energia. Quando ele estiver exausto e confuso, atacas com energia e propósito.

5- Saquear a casa em chamas

Quando um Estado está envolvido em conflitos internos, quando a doença e a fome dizimam a população, quando a corrupção e o crime estão em crescendo, então vai ser incapaz de lidar com uma ameaça externa. Essa é a hora de atacar.

6- Fazer um som no Este e atacar no Oeste

Em qualquer batalha o elemento da surpresa pode proporcionar uma vantagem devastadora. Mesmo cara-a-cara com um inimigo, a surpresa pode ser usada, atacando onde ele menos espera. Para fazer isto, deves criar uma expectativa na mente do inimigo, através do uso de uma finta.

Capítulo 2 – Estratégias para lidar com o inimigo

7- Criar algo do nada

Usar a mesma finta duas vezes. Tendo reagido à primeira e provavelmente também à segunda, o inimigo vai hesitar em reagir à terceira finta. Então a terceira finta é o verdadeiro ataque que vai apanhar o teu inimigo com a guarda em baixo.

8- Esgueirar-se pela passagem de Chencang

Ataca o inimigo com duas forças convergentes. A primeira é o ataque directo, um que é óbvio e para o qual o inimigo vai preparar a defesa. O segundo é o indirecto, o ataque sinistro que o inimigo não espera e que o faz dividir as suas forças à última hora levando-o à confusão e ao desastre.

9- Ver as árvores a arder do outro lado do rio

Atrasa a tua entrada no campo de batalha até todos os outros participantes estarem cansados de lutar uns contra os outros. Então entra com toda a força e apanha os pedaços.

10- Esconder uma faca atrás de um sorriso

Sê simpático e encanta o inimigo. Quando tiveres ganho a sua confiança, move-te contra ele em segredo.

11- Sacrificar a ameixeira para preservar o pessegueiro

Há circunstâncias em que deves sacrificar os objectivos de curto prazo de forma a atingir o alvo de longo prazo. Esta é a estratégia do bode expiatório em que alguém sofre as consequências para que todos os outros não o façam.

12- Aproveitar a oportunidade para roubar uma cabra

Enquanto fizeres os teus planos, sê suficientemente flexível para tirar vantagem de qualquer oportunidade que se apresente, por mais pequena que seja, e agarra-te a qualquer ganho, por mais pequeno que seja.

Capítulo 3 – Estratégias de ataque

13- Agita a cobra, batendo na relva à sua volta

Na preparação da batalha, não alertes o inimigo para as tuas intenções ou denuncies a tua estratégia prematuramente.

14- Pedir um cadáver emprestado para ressuscitar a alma

Pega numa instituição, numa tecnologia ou um método que tenha sido esquecido ou abandonado e apropria-te dele para teu uso. Faz reviver algo do passado dando-lhe um novo propósito ou reinterpretando-o para trazer à vida velhas ideias, costumes e tradições.

15- Engodar o tigre para que saia do seu covil na montanha

Nunca ataques directamente um inimigo cuja vantagem deriva da sua posição. Em vez disso, leva-o para fora da posição vantajosa, separando-o assim da sua fonte de força.

16- Para capturar é preciso libertar

Presas encurraladas frequentemente fazem um ataque final desesperado. Para evitar isto, deves fazer o inimigo acreditar que ainda tem uma hipótese de fuga. A sua determinação em lutar vai assim ficar reduzida pelo seu desejo de escapar. Quando no final, a liberdade se prova falsa, a moral do inimigo será derrotada e ele render-se-á sem luta.

17- Atirar um tijolo para apanhar uma pedra de jade

Prepara uma armadilha e leva o teu inimigo a ela usando um engodo. Na guerra, o engodo é a ilusão de uma oportunidade de vitória. Na vida o engodo é a ilusão da riqueza, do poder e do sexo.

18- Derrotar o inimigo capturando o seu chefe

Se o exército inimigo é forte mas está ligado ao comandante apenas por dinheiro ou ameaças, então faz do líder o teu alvo. Se o comandante cair, o resto do exército vai dispersar
-se ou passar-se para o teu lado. Se, no entanto, eles estiverem ligados ao líder por lealdade, então tem cuidado, o exército poderá continuar a lutar depois da sua morte por vingança.

Capítulo 4 – Estratégias do caos

19- Retirar a lenha de debaixo da panela

Quando confrontado com um inimigo demasiado poderoso para combater directamente, deves enfraquecê-lo primeiro, minando as suas fundações e atacando a sua fonte de poder.

20- Apanhar um peixe enquanto a água está turva

Antes de confrontares o teu inimigo, gera confusão para enfraquecer a sua percepção e julgamento. Faz qualquer coisa invulgar, estranha e inesperada pois isso vai levantar a suspeita do inimigo e perturbar o seu pensamento. Um inimigo distraído é mais vulnerável.

21- Remover a carapaça da cigarra

Quando estiveres em perigo de ser derrotado e a tua única hipótese é fugir e reagrupar, então cria uma ilusão. Enquanto o inimigo está focado nesse artifício, então secretamente remove os teus homens, deixando para trás apenas a ilusão da tua presença.

22- Fechar a porta para apanhar o ladrão

Se tiveres uma possibilidade de capturar completamente o inimigo, então deves fazê-lo para levar a batalha ou a guerra a um final rápido e duradouro. Permitir que o inimigo escape é plantar as sementes para conflitos futuros. Mas se ele conseguir escapar, tem cuidado ao persegui-lo.

23- Amigar-se de um Estado distante enquanto se ataca um vizinho

È sabido que nações vizinhas se tornam inimigas enquanto que nações distantes dão melhores aliados. Quando és o mais forte num campo, a tua maior ameaça é o segundo mais forte nesse campo, não é o mais forte de um campo diferente.

24- Obter salvo-conduto para conquistar o Estado de Guo

Usa os recursos de um aliado para atacar um inimigo comum. Assim que o inimigo estiver derrotado, usa esses recursos contra o aliado que te os emprestou em primeiro lugar.

Capítulo 5 – Estratégias de proximidade

25- Trocar as vigas por madeiras podres

Baralha as formações do inimigo, interfere com os seus modos de operar, muda as regras que ele está habituado a seguir, segue ao contrário do seu treino habitual. Desta maneira retirarás os pilares que o sustentam, o elo comum que faz de um grupo de homens uma força de combate eficiente.

26- Apontar para a amoreira enquanto se amaldiçoa a acácia

Para disciplinar, controlar ou avisar outros, cujo status ou posição os exclui da confrontação directa, usa a analogia e a insinuação. Sem nomear nomes directamente os acusados não podem retaliar sem revelar a sua cumplicidade.

27- Fazer-se passar por parvo

Esconde-te atrás da máscara de um louco, um bêbado ou um parvo para gerar a confusão acerca das tuas intenções e motivações. Leva o teu oponente a subestimar as tuas capacidades até que o excesso de confiança o faça baixar a guarda. Então, podes atacar.

28- Remover a escada quando o inimigo chegar ao telhado

Com engodos e enganos leva o teu inimigo até um terreno traiçoeiro. Então, corta-lhe as linhas de comunicação e as rotas de fuga. Para se salvar ele terá de lutar contra ti e contra as forças da natureza.

29- Decorar a árvore com flore falsas

Atar flores de amoreira a uma árvore morta cria a ilusão de que a árvore é saudável. Através do uso do artifício e do disfarce faz uma coisa sem valor parecer valiosa, sem perigo parecer ameaçadora e sem uso parecer útil.

30- Fazer o anfitrião e o convidado trocar de papel

Derrota o inimigo a partir de dentro, infiltrando o seu campo sob pretexto de cooperação, rendição ou tratados de paz. Desta forma consegues descobrir as suas fraquezas e depois, quando o inimigo estiver relaxado, ataca directamente a fonte da sua força.

Capítulo 6 – Estratégias de derrota

31- A armadilha do mel

Manda mulheres lindas ao teu inimigo para causar a discórdia no seu campo. Esta estratégia pode funcionar em três níveis. Primeiro, o governante fica tão enamorado da beleza que negligencia os seus deveres e desvanece a sua vigilância, Segundo, outros machos na corte vão começar a exibir um comportamento agressivo que inflama diferenças menores reduzindo a cooperação e minando a moral. Terceiro, outras fêmeas na corte, motivadas pela inveja e ciúme, começam a planear intrigas agravando ainda mais a situação.

32- A táctica do forte vazio

Quando o inimigo é superior numericamente e a tua situação é tal que esperas ser derrotado a qualquer momento, então abandona qualquer aparência de preparação militar e age casualmente. A não ser que o inimigo tenha uma descrição precisa da tua situação, esse comportamento anormal vai-lhe despertar suspeitas. Com sorte, será dissuadido de atacar.

33- Fazer os espiões do inimigo semear a discórdia no seu próprio campo

Mina a capacidade de o teu inimigo lutar provocando a discórdia entre ele e os seus amigos, aliados, conselheiros, família, comandantes, soldados e população. Enquanto ele estiver ocupado a resolver disputas internas, a sua capacidade de atacar ou de se defender, está comprometida.

34- Ferir-se a si próprio para ganhar a confiança do inimigo

Fingir-se ferido tem duas aplicações possíveis. Na primeira, o inimigo é levado a relaxar a sua guarda, uma vez que já não te considera uma ameaça eminente. A segunda é uma maneira de te insinuares junto do teu inimigo, fingindo que a ferida foi provocada por um inimigo comum.

35- Uma corrente de estratégias

Em matérias importantes deve-se usar uma corrente de estratégias aplicadas simultaneamente e consequentemente umas às outras, como uma corrente de estratégias. Manter diversos planos em funcionamento num esquema geral, no entanto, se uma destas estratégias falhar, a corrente quebra e todo o esquema falhará.

36- Se tudo o resto falhar, retirar

Se se tornar óbvio que o teu actual plano de acção vai levar a uma derrota, então retira e reagrupa. Quando o teu lado está a perder só há três escolhas possíveis: render-se, entrar em compromisso ou fugir. A rendição é a derrota completa, o compromisso é meia derrota, mas a fuga não é derrota. Enquanto não fores derrotado, ainda tens uma hipótese.

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