domingo, 21 de janeiro de 2007

Anátema

Intervalamos a nossa dissertação sobre a Maçonaria para nos debruçarmos sobre mais um termo utilizado nos discursos políticos. No presente caso, a palavra em questão foi endereçada a este vosso amigo na forma da sugestão de que “lançava sobre os funcionários públicos o anátema da ineficiência e ineficácia”. Não estando em causa a veracidade da afirmação, mas o seu sentido, acabámos por optar pela explicitação do termo “anátema”, em lugar de nos lançarmos em mais uma dissertação de extensão idêntica à que já temos em curso, desta vez sobre o tema da “Selecção dos estilos da linguagem conforme os objectivos que se pretendem atingir e as reacções que se pretendem obter”, (eu sei que ia parecer um título saído do Príncipe do Maquiavel, mas acabará por ser tratado neste breviário, mais tarde, com um título mais simples: Planeamento e Elaboração do Discurso).

Não nos demoremos mais e façamos, então, uma rápida visita ao Anátema.


6- Anátema

Anátema é uma palavra que nos chega directamente do Grego (Ανάθεμα), significando originalmente “algo erguido como oferenda aos Deuses”, mais tarde, veio também a ser utilizado como significando ser formalmente banido, exilado, excomungado, denunciado e, em alguns contextos também foi usado com o significado de “amaldiçoado”.

O significado original da palavra, na literatura Grega, era o de uma oferta aos Deuses. Quando os textos hebraicos da Bíblia foram traduzidos para Grego, a palavra foi utilizada para traduzir a palavra hebraica “herem”, com a qual ficou associada a partir daí. “Herem” designa algo proibido ou proscrito. A palavra foi usada para designar ofertas feitas a Deus, e, portanto, proibidas aos comuns mortais. Assim, a associação destas duas palavras, levou a que Anátema passasse a significar algo que está fora do alcance, e, logo, separado do nosso mundo. A utilização corrente levou a que passasse a designar tudo o que era posto à parte, e assim, na sua conotação negativa, tudo ou todos os que eram banidos ou excluídos e considerados amaldiçoados e, por isso, intocáveis e sem qualquer espécie de possibilidade de redenção.

Para a Igreja Católica, o termo anátema acabou por designar uma forma de sanção religiosa ainda mais severa que a excomunhão. O registo mais antigo deste uso da palavra foi feito no “Concílio de Elvira”, em 306 d.C., e, a partir daí passou a ser uma forma comum de excluir os hereges. Cirílo de Alexandria lançou doze Anátemas contra Nestório, Arcebispo de Constantinopla, em 431 d.C.. Nestório é considerado o originador da Heresia Cristológica, por ter pregado contra o uso do termo “Mãe de Deus” para designar a “Virgem Maria”, preferindo, nos seus sermões, usar a expressão “Mãe de Cristo”. Paralelamente ao debate Cristológico, decorria uma luta política entre os apoiantes da Sé de Alexandria e os da Sé de Antioquia sobre a influência do Imperador sobre a Sé de Constantinopla ou a primazia patriarcal do Papa. Nestório foi apanhado no meio e provavelmente será causa para falarmos num outro dia.

No Séc. XIX, havia uma distinção formal entre Anátema e Excomunhão. Excomunhão designava o afastamento de uma pessoa do rito da Eucaristia, enquanto Anátema designava a exclusão total do sujeito do povo da Igreja.

Enquanto a excomunhão podia ser declarada por qualquer Bispo, a declaração do anátema tinha que ser efectuada pelo próprio Papa. O anátema era imposto pelo Papa numa cerimónia específica para o efeito. O Código Canónico de 1917, que aboliu todas as penalidades eclesiásticas não mencionadas no próprio código, tornou anátema sinónimo de excomunhão. O Código Canónico em vigor nos nossos dias, já não menciona a palavra “anátema” e o ritual efectuado em outros tempos já não faz parte dos usos do Pontificado Romano.

Pedro Estadão

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